terça-feira, setembro 27, 2005

Eu explico melhor

(Fiquei com vontade de elaborar o post anterior)

Cresci numa vila pequena, católica, de costumes tradicionais. Não nasci lá, que sou rapariga de perto da capital deste fim da europa, mas fui lá parar mesmo a tempo de começar a escola primária.

Os meninos e as meninas da minha classe eram todos muito simpáticos, até começarmos a ter Religião e Moral, no 2º ciclo. Aí eles deram-se conta que a muito amiga deles, eu, nao era católica. Nem baptizada. Nem sequer se dedicava muito a pensar me Deus. Era, em suma, ateia. Mas nem esta palavra conhecia.

Os meu pais não são católicos.A minha mãe nem é baptizada, pois pediram 2,50 escudos ao meu Avô para a baptizar, ao que ele os mandou baptizar a senhora mãe deles.
Não fui criada em ambiente de idas à missa, nem de padrinhos de baptismo (o que depressa percebi ser uma perda enorme na minha quota de prendas anuais) nem catequese. Sabia o Pai Nosso e a Avé Maria porque a minha Avó me tinha ensinado, em conjunto com uma mão-cheia de canções como a do "ó lua que vais tão alta...".

Assim, na primeira aula de Religião e Moral, quando perguntaram a nossa religião e todos responderam que eram católicos, eu fiquei calada. Ao ser interrogada sobre a minha religião valeu-me a Filipa, rapariga de muito sentido prático já aos 10 anos (devia ter aprendido mais com ela) que rapidamente me tirou do embaraço e disse que era ateia, ao que eu assenti, de olhos no chão...sabia lá eu se era a teia ou a aranha...queria lá saber. A mim ensinaram-me que mais vale trabalhar que esperar por milagres, pois a probabilidade de conseguirmos atingir as nossas metas é bastante mais elevada. Deus não entrava nesta equação.

Curiosamente, a partir daí foi um sem fim de perguntas sobre Jesus e a Virgem, sobre o que eu sabia ou não, se rezava à noite (wtf??) se nunca tinha ido à missa, se ia casar pela igreja (mas vocês ensandeceram??), se nao tinha padrinhos (lá estava..as prendas...) e se queria ir baptizar-me...Oh Lord.

Claro que, quando cheguei a casa com estas duvidas existenciais, os meus Pais prontamente me disseram: "Filha, se quiseres ir baptizar-te é só dizeres, e vamos lá. Inscrevemos-te na catequese e tudo!" com um ar de gozo, divertidos pela minha estupefação (aliás, eles foram assim com tudo...era só pedir e far-se-ia, mas sempre com autorização e conhecimento deles; desde fumar erva a tomar a pílula...isto tem os seus prós e contras).

Nao me baptizei, suportei a curiosidade dos meus colegas, aquele ar deles de "ela não é normal, é esquisita", mas aparentemente isso tornou-me mais apelativa aos olhos deles, porque enquanto eles sabiam o Terço, eu sabia as letras de Simon e Garfunkel e Jaques Brell. Enquanto eles liam o Novo Testamento (acho eu), eu lia o Trópico de Câncer do Miller, ou Bocage. Enquanto eles ouviam MiniStar, eu levava com Springsteen, que a minha irmã ouvia aos altos berros.

Nunca me passou este estigma de ser diferente. Hoje, quando chego àquela terra, sei que sou diferente. O facto de não estar lá faz de mim diferente.

Surpreendentemente casei há 5 anos pela igreja. Aos 23 anos estava separada. Parece que não li bem os sinais que me foram sendo dados ao longo da vida. Pode ser que os veja melhor daqui para a frente.

Isto tudo para dizer áquela menina, que se diz "marginalizada" por ser católica, que ainda tem muito caminho para percorrer. Ela e os católicos todos, que ainda agora começaram as suas provações e os testes à sua fé.


Comments:
Ser ateu n me impediu de acabar na cruz, pah!
 
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